O termo carnaval é de origem incerta, embora seja encontrado já no latim medieval, como carnem levare ou carnelevarium, palavra dos séculos XI e XII, que significava a véspera da quarta-feira de cinzas, isto é, a hora em que começava a abstinência da carne durante os quarenta dias nos quais, no passado, os católicos eram proibidos pela igreja de comer carne.
A própria origem do carnaval é obscura. É possível que suas raízes se encontrem num festival religioso primitivo, pagão, que homenageava o início do Ano Novo e o ressurgimento da natureza, mas há quem diga que suas primeiras manifestações ocorreram na Roma dos césares, ligadas às famosas saturnálias, de caráter orgíaco. Contudo, o rei Momo é uma das formas de Dionísio — o deus Baco, patrono do vinho e do seu cultivo, e isto faz recuar a origem do carnaval para a Grécia arcaica, para os festejos que honravam a colheita. Sempre uma forma de comemorar, com muita alegria e desenvoltura, os atos de alimentar-se e beber, elementos indispensáveis à vida.
Período de duração. Os dias exatos do início e fim da estação carnavalesca variam de acordo com as tradições nacionais e locais, e têm-se alterado no tempo. Assim, em Munique e na Baviera (Alemanha), ela começa na festa da Epifania, 6 de janeiro (dia dos Reis Magos), enquanto em Colônia e na Renânia, também na Alemanha, o carnaval começa às 11h11min do dia 11 de novembro (undécimo mês do ano). Na França, a celebração se restringe à terça-feira gorda e à mi-carême, quinta-feira da terceira semana da Quaresma. Nos Estados Unidos, festeja-se o carnaval principalmente de 6 de janeiro à terça-feira gorda (mardi-gras em francês, idioma dos primeiros colonizadores de Nova Orleans, na Louisiana), enquanto na Espanha a quarta-feira de cinzas se inclui no período momesco, como lembrança de uma fase em que esse dia não fazia parte da Quaresma. No Brasil, até a década de 1940, sobretudo no Rio de Janeiro, as festas pré-carnavalescas se iniciavam em outubro, na comemoração de N. Sra. da Penha, crescia durante a passagem de ano e atingia o auge nos quatro dias anteriores às Cinzas — sábado, domingo, segunda e terça-feira gorda. Hoje em dia, tanto em Recife (Pernambuco), quanto em Salvador (Bahia), o carnaval inclui a quarta-feira de cinzas e dias subseqüentes, chegando, por vezes, a incluir o sábado de Aleluia.
Carnaval no Brasil. Nem um décimo do povo participa hoje ativamente do carnaval— ao contrário do que ocorria em sua época de ouro, do fim do século XIX até a década de 1950. Entretanto, o carnaval brasileiro ainda é considerado um dos melhores do mundo, seja pelos turistas estrangeiros como por boa parte dos brasileiros, principalmente o público jovem que não alcançou a glória do carnaval verdadeiramente popular. Como declarou Luís da Câmara Cascudo, etnólogo, musicólogo e folclorista, "o carnaval de hoje é de desfile, carnaval assistido, paga-se para ver. O carnaval, digamos, de 1922 era compartilhado, dançado, pulado, gritado, catucado. Agora não é mais assim, é para ser visto".
Entrudo. O entrudo, importado dos Açores, foi o precursor das festas de carnaval, trazido pelo colonizador português. Grosseiro, violento, imundo, constituiu a forma mais generalizada de brincar no período colonial e monárquico, mas também a mais popular. Consistia em lançar, sobre os outros foliões, baldes de água, esguichos de bisnagas e limões-de-cheiro (feitos ambos de cera), pó de cal (uma brutalidade, que poderia cegar as pessoas atingidas), vinagre, groselha ou vinho e até outros líquidos que estragavam roupas e sujavam ou tornavam mal-cheirosas as vítimas. Esta estupidez, porém, era tolerada pelo imperador Pedro II e foi praticada com entusiasmo, na Quinta da Boa Vista e em seus jardins, pela chamada nobreza... E foi livre até o aparecimento do lança-perfume, já no século XX, assim como do confete e da serpentina, trazidos da Europa.
O Zé-Pereira. Em todo o Brasil, mas sobretudo no Rio de Janeiro, havia o costume de se prestar homenagem galhofeira a notórios tipos populares de cada cidade ou vila do país durante os festejos de Momo. O mais famoso tipo carioca foi um sapateiro português, chamado José Nogueira de Azevedo Paredes. Segundo o historiador Vieira Fazenda, foi ele o introdutor, em 1846, do hábito de animar a folia ao som de zabumbas e tambores, em passeatas pelas ruas, como se fazia em sua terra. O zé-pereira cresceu de fama no fim do século XIX, quando o ator Vasques elogiou a barulhada encenando a comédia carnavalesca O Zé-Pereira, na qual propagava os versos que o zabumba cantava anualmente: E viva o Zé-Pereira/Pois que a ninguém faz mal./Viva a pagodeira/dos dias de Carnaval! A peça não passava de uma paródia de Les Pompiers de Nanterre, encenada em 1896. No início do século XX, por volta da segunda década, a percussão do zé-pereira cedeu a vez a outros instrumentos como o pandeiro, o tamborim, o reco-reco, a cuíca, o triângulo e as "frigideiras".
As fantasias. O uso de fantasias e máscaras teve, em todo o Brasil, mais de setenta anos de sucesso — de 1870 até início do decênio de 1950. Começou a declinar depois de 1930, quando encareceram os materiais para confeccionar as fantasias — fazendas e ornamentos –, sapatilhas, botinas, quepes, boinas, bonés etc. As roupas de disfarce, ou as fantasias que embelezaram rapazes e moças, foram aos poucos sendo reduzidas ao mais sumário possível, em nome da liberdade de movimentos e da fuga à insolação do período mais quente do ano.
E foram desaparecendo os disfarces mais famosos do tempo do império e início da república, como a caveira, o velho, o burro (com orelhões e tudo), o doutor, o morcego, diabinho e diabão, o pai João, a morte, o príncipe, o mandarim, o rajá, o marajá. E também fantasias clássicas da commedia dell’arte italiana, como dominó, pierrô, arlequim e colombina — de largo emprego entre foliões e que já não tinham razão de ser, depois que a polícia proibiu o uso de máscaras nos salões e nas ruas... Aliás, desde 1685 as máscaras ora eram proibidas, ora liberadas. E a proibição era séria, bastando dizer que as penas, já no século XVII, eram rigorosíssimas: um proclama do governador Duarte Teixeira Chaves mandava que negros e mulatos mascarados fossem chicoteados em praça pública, e brancos mascarados fossem degredados para a Colônia do Sacramento.
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